ZENOZINE

  corrida de São Silvestre – o ladrão de celular correndo da polícia  

  estado da lua: crescente, tal qual minha unha

  noite de Réveillon – distante do litoral pulo sete calçadas

  clarão no céu  cinco segundo depois ruido de trovão

  do fundo poço  que linda vista! haiku de Issa

  noite de Ano Novo – não vai pra Terra Pura quem morder o sôba

  visita ao cemitério – dormideiras se espreguiçam sobre a lápide

  férias de verão – fuma o cigarro eletrônico o jovem com espinhas

  matinho na calha desvia para a calçada a chuva de verão

  não vejo a hora de dar um bico na lua – vem, ano novo!

  crisântemos brancos – o terço da minha mãe enlaçado no ícone

  almoço de Natal – finjo estar ao telefone para poder peidar

  noite de Natal – os escapamentos das motos estourando

  véspera de Natal a toalha-de-mesa nova e meus pais ausentes

  uma pessoa tira foto com outra – noite de verão para Silvia Rocha

  primeiro dia de verão – as aleluias contra a luz viram vaga-lumes

  nova fase todas as lutas – para vencer   para Silvia Rocha

  o punk espera no ponto de táxi a chuva passar

  pano de prato pendurado no pescoço – também me seco para Silvia Rocha

  raquete elétrica sobre o banco de zazen  depois da chuva

  fim da primavera – ainda tem papel higiênico como o mundo bom!

  fim da tarde –   os containers da Vedacity entre a copa das árvores

  nuvens passageiras – o vendedor de algodão doce na entrada do circo

  prédio do bairro – entre os enfeites de natal o limpador de vidro pisca-piscas desligados  – entre a decoração de natal o limpador de janela prédio do bairro – o limpador de janelas com fones de ouvido

  sinal vermelho – retrovisores refletem o vendedor de bala

  panetone aberto – o cheiro do fim do ano atrai as abelhas

  circo do Parque – na fila da bilheteria o ladrão de celular

  enxada e caneta – com mãos calejadas um país de haikai para Nempuku Sato

  vento forte corre a toalha pelo varal

  invasão ao Japão – também é Itaquera a terra de Bashô

  bolada na grelha  – amigos se encontram praquela pelada

  casa abandonada – o matagal envolve o jovem casal   casa abandonada – o muro velho cede ao jovem casal

  bonenkai do ano – de bem com a prática critico a monja

  no canteiro entre bitucas de cigarro  flor de açafrão para Felipe Blanco

  na esquina da rua aos pés da bananeira – móveis com cupim

  só fica o espiral do calendário velho – primavera que parte

  casal de pombos. no banquete nupcial manjar de piolhos

  moeda esquecida no meio da roupa suja  ruido no tanque

  vassoura na mão  o gari pede caixinha de porta em porta

  a taturana na porta  sonha com a grama  borboleta um dia

    expulso do mosteiro procuro uma sangha longe de Pinheiros expulso do mosteiro mantenho o hômyô que recebi do Buda 

  na telha da lavanderia casinha de marimbondos dois fazem a ronda

  calor de primavera – por baixo da cortina varejeira dourada

  pia de madrugada com a sirene do guarda passarinho sabido

  hoje o sol apareceu – conto os blocos de concreto da construção ao lado

  mosquinha do arroz não fique ansiosa tem para nós dois

  sirene de ambulância – os carros abrem passagem com o sinal fechado

  sereno da noite – incrível como molha sem barulho

  pano de chão úmido – a senhora escorrega na entrada da igreja

  na hora da xepa duelo de guarda-chuvas e carrinhos de feira chuva de primavera  a bacia apara a goteira na banca de verduras

  deitado na garagem sobre a mancha de óleo  o gato malhado o gato deitado no chão de arco-íris  espera o verão

  rio tietê de noite – o pisca alerta ligado do carro rebocado

  cachorro na coleira – neta e avó colhem manga com a vassoura

  primeiro minuto do ano – lá se vão os primeiros batimentos cardíacos

  novo calendário na parede de cozinha  Seicho-no-ie 2025

  noite de ano novo – o ruido barulhento dos escapamentos

  presépio de natal – nasceu o menino Jesus na caixa de papelão

  quanto perfume! despida no canteiro a dama-da-noite

  Novena de Natal –

  céu sem nuvens e sem estrelas – giroflex da polícia

  ao lado da ponte meninos jogam bola  traves de chinelo

  calçada manchada no caminho da quitanda – amoreira ao alto

  velho móvel infestado de cupim  asinhas e poeira

  chuva de verão – a moça de seios fartos acelera o passo

  Parque da Juventude – a moça de shortinho responde ao fiu fiu

  levantou-se o verão muitos perigos, cuidado! alegria, felicidades!

  o gato da vizinha enroscado no pisca-pisca... natal chegando

  tarde de dezembro – embaixo do ipê amarelo descansa   o sorveteiro 

  no chapéu de palha do vendedor de batatas o vento rodopia

  71 – Verão   夏 entre o vão do bueiro e a calçada capim novo!

  fim da primavera – as primeiras cigarras começam a cantar  

  cheiro de gás ninguém acenda a luz! janelas abertas

  pausa no trabalho – o funcionário da limpeza se lembra da infância Biblioteca de S.Paulo

  madrugada abafada – uma barata no quintal de barriga para cima

  vai-se a primavera uma foto de Bashô me acompanha

  dia das crianças  a cicatriz do joelho marca da infância

  friozinho no bairro – sem ninguém no ponto o ônibus passa

  noite estrelada – sobre a Cantareira as três marias

  esta primavera quanta dor nas costas! maritacas na telha

  cortando a unha a luz do poste ilumina o corte da tesourinha

  moscas do quintal fiquem aí moscando até o carnaval

  uma travesti no ponto de ônibus canta Patti Smith   Av. São João

  ventinho frio – patos e namorados em volta do lago     Parque do Ibirapuera

  pra cá e pra lá a vida dos peixes conforme o vento Parque do Ibirapuera

  tarde no Ibirapuera – me guio pelas nuvens a caminho de Quioto

  passou batida pelas minhas orelhas brisa primaveril

  véspera de feriado – no banco da praça o tiozão chapado

  hora do almoço – na tampa da marmita a abelha descansa

  meio trabalhando meio desempregado – vento de primavera

  chuva de primavera – que situação a minha me secando no metrô

  tapioca com mel – meu jantar desta noite de lua crescente

  coroa para fora – a velhinha carrega o abacaxi na sacola

  tarde com rojões – latem ao mesmo tempo toda a cachorrada

  Missa de Domingo – o catador desamarra o carrinho do poste   Capela São Judas – Mooca

  a chuva procura uma janela para entrar – manhã de primavera

  o pipoqueiro apaga a lâmpada do carrinho  – chuvisco outonal

  amigos em volta – o som do plástico rasgando   Lançamento do livro O Pintor de Biombo, Banca da É selo de Língua, Feira Miolos, Biblioteca Mário de Andrade, novembro de 2024.

  horta adubada – a imagem de São Francisco ao lado do tomilho

  cenoura ralada – os dedos manchados de vermelho

  o apito do guarda na calada da noite entre os latidos 

  apito do guarda – atravessa o silêncio da madrugada

  o chuveiro pingando  interrompe o grande silêncio noturno

  sobre o muro de cacos de vidro – o gato noturno

uma flor caída de manga jasmim estreito  canteiro  

  de longe parece um tapete de veludo  – musgo no muro

  Assunção de Maria – se agasalhe bem mãezinha faz frio lá em cima!

  sozinho no canto, esta vida no subúrbio não troco por nada

  Ah! Monte Fuji e o morro do Itatins... lembranças da praia

  32   - 69 Primavera  春 ano após ano   calço o mesmo croquis para ir à feira

  fim de outono – o vento e o sanhaço apostam corrida

  na máquina de lavar o gato da vizinha me espia  pouco me conheço!

  vento outonal o ninho da maritaca no capô do carro

  madrugada fria acabaram de roubar o carro do padre

  após o aguaceiro  o dono da padaria à luz de velas

  metrô São Bento – a sacoleira procura lugar para sentar

  Bom dia! que bom despertar e arrumar a cama

  o carroceiro passa recolhendo papelão manhã de inverno

  vamos caminhar pelo mundo das águas – água é música  

  o braço enfaixado do velho no banco da praça  – manhã de inverno 

  Chuva e frio tudo fodido, mas sigo sorrindo

  noite de inverno – a luz da sala pisca e depois queima

  as linhas do hokku sobrepostas tornam-se três  sol terra e lua vermelha   Fusatsu 

  18 - 31 Inverno 冬 manhã de inverno – sem ter pra onde ir depois do banho

  neste Dia dos Pais vou admirar a lua sem meu pai  

raspo a cabeça uma vez ao ano – vento nas orelhas  

eu e um colega carregando pedras – dia de Santa Ana  

  passar o café e não sujar as mãos durante a faxina

  indo pra padaria nada é tão esburacada que esta calçada

  velário da igreja – a secretária raspa as ceras secas

  cerração da noite – no velário da capela restos de cera 

  no fundo da gaveta as sandálias franciscanas – presente de mamãe